sábado, 4 de janeiro de 2025

+ CIDADANIA: Uma década perdida para Braga

 

O ano de 2013 prometia ser um momento de grande mudança para Braga. As eleições autárquicas desse ano seriam, para a maioria dos cidadãos, uma oportunidade para reformular as prioridades na gestão do território, dada a alteração inevitável da liderança da Câmara Municipal. Para muitos bracarenses, que confiaram que a mudança de ciclo político e dos seus protagonistas representaria uma profunda alteração no âmbito da valorização patrimonial, esta foi uma década perdida.

Se no âmbito da dinamização cultural, grande parte dos objetivos foram sendo alcançados - salvo a (inexplicavelmente) gorada pretensão de tornar Braga na próxima Capital Europeia da Cultura portuguesa – já no âmbito da valorização patrimonial, a maioria das propostas não passaram de devaneios, jamais ultrapassando as versões eleitoralistas dos desígnios sufragados, as palavras ditas em discursos eivados de dotes oratórios ou as parangonas plantadas na imprensa pelo gabinete de comunicação municipal.

Após mais de uma década, os bracarenses continuam a aguardar pelo famigerado parque eco-monumental das Sete Fontes (será preciso mais de uma década para resolver todas as questões urbanísticas e burocráticas?); permanecem expectantes relativamente à musealização em curso da Ínsula das Carvalheiras ou à (tantas vezes reafirmada) conservação e musealização das ruínas da Estação Arqueológica de Santa Marta das Cortiças; e certamente se encontram desiludidos com o destino do edifício da antiga Saboaria e Perfumaria Confiança, que havia sido adquirido pela Câmara Municipal de Braga (com o suporte dos atuais protagonistas políticos), para ser utilizado para finalidades culturais, estando atualmente a ser transformado numa residência universitária que irá densificar, ainda mais, a área urbanizada naquela zona da cidade.

As grandes conquistas no âmbito da valorização patrimonial não se deveram diretamente à intervenção municipal, de que são exemplo maior o reconhecimento do Santuário do Bom Jesus do Monte como Património da Humanidade pela UNESCO, processo conduzido pela Arquidiocese de Braga e pela Confraria do Bom Jesus, que seria finalizado em 2019; e a inscrição das solenidades da Semana Santa de Braga no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, uma iniciativa da Comissão da Semana Santa terminada em 2022.

Numa cidade cujos responsáveis afirmam a Cultura como uma prioridade, esfregando no rosto dos mais críticos o título de Capital Nacional da Cultura, que vai ostentar durante o ano que agora se inicia, como justificar que o Museu da Imagem – uma das iniciativas do executivo municipal que havia sido tão criticado por um presumível desleixo cultural – esteja fechado para obras há seis anos; que a Casa dos Crivos, única galeria municipal, se encontre na mesma situação há quatro anos; ou que a Torre de Menagem, que passou a estar aberta em permanência desde 2017, com uma exposição permanente sobre a história da cidade, se encontre encerrada para a substituição de uma trave de madeira?

Por mais eventos que sejam criados ou reformulados, alguns com especiais méritos histórico-patrimoniais, como é o caso da Braga Barroca ou do Festival de Órgão, isso não significa necessariamente uma aposta declarada na valorização patrimonial. Aliás, à luz da presuntiva Estratégia Cultural 2020-2030, já foram sentenciadas algumas das dinâmicas culturais inauguradas no presente ciclo político, como são os paradigmáticos casos do Festival de Guitarra, o programa “Olhó Teatro”, o Concurso de Bandas Filarmónicas, o projeto de Musicologia “Património Musical do Concelho de Braga” ou o Prémio de História Local Dr. Manuel Monteiro.

Como nos diz Umberto Eco, no seu célebre ensaio de crítica cultural, “o Apocalipse é uma obsessão do 'dissenter', a integração é a realidade concreta dos que não dissentem". Ou seja, como traçar uma estratégia cultural tentando impingir à população um conjunto de opções profundamente elitistas, descurando a identidade do território e aquilo que os seus agentes e entidades já produzem? Oferecer mais e melhores condições para a criatividade é um enorme mérito daquele documento, e uma enorme fragilidade do contexto cultural bracarense hodierno, no entanto, jamais poderemos descurar a dinâmica que os bracarenses já são capazes de gerar, nomeadamente a relevância da investigação histórica e todas as expressões da cultura popular.

Desejamos que o ano de 2025 seja efetivamente um momento de transformação para Braga no âmbito da valorização patrimonial. Esperamos, acima de tudo, que as diversas propostas que sejam apresentadas aos bracarenses para o próximo ciclo de governação municipal, não olvidem a relevância histórica e patrimonial do nosso território, mas determinadamente desafiem a teia de interesses instalados e percebam a Cultura, com tudo o que implica no âmbito da valorização patrimonial, como o caminho mais direto para a coesão da comunidade e para a sua afirmação nacional e internacional.

 Será possível entrevermos esperança no futuro de Braga?

 

Rui Ferreira

Presidente da Direção da Braga Mais

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